domingo, janeiro 24

Raiva e Rancor

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Para que perdoar?
O motivo mais óbvio para perdoar é o de nos libertarmos dos efeitos debilitantes da raiva e do rancor crônicos. Ao que parece, estas duas emoções são as que mais convertem o perdão em um desafio, podendo ser uma grata possibilidade para quem deseja uma paz maior.
A raiva e o rancor são emoções muito fortes, que desgastam nossa energia de várias formas.
Ao retirar as capas protetoras, provavelmente você descobrirá que essa raiva na realidade é um sentimento superficial. Não no sentido que seja trivial ou falso, e sim que existem muitos outros sentimentos por baixo dele. Quando nos perdemos na raiva, ficamos surdos aos nossos sentimentos mais profundos. Aprendemos a escutar somente aqueles que gritam mais forte.

Faça uma pausa e pense em alguma ocasião em que você ficou com raiva. Como se sentia? Ou, se nestes momentos a cólera invade seu ser, tome consciência de como você se sente. Agora, respire fundo e penetre em seus sentimentos. O que você vê sob sua raiva? Vê medo? Sente que você foi ferido ou abandonado? Olhe ainda mais profundamente. Debaixo desse medo, frustração ou tristeza, existe um pedido para que alguém preste atenção em você, de que o escute? Existe um pedido, consciente ou inconsciente, de respeito, reconhecimento, interesse, amor?
A raiva é uma intensa reação emocional temporal quando alguém se sente ameaçado de alguma forma. Quando surge, pode-se expressar aberta e diretamente, ou pode-se ocultar dentro de si, onde se expressa de um modo calado e persistente, em forma de ressentimento crônico, que é uma sensação constante de ofensa ou de má vontade que persiste por muito tempo depois de que tenha passado a situação que provocou a raiva. O ressentimento foi comparado ao ato de se agarrar a uma brasa acesa com a intenção de passá-la a outro, queimando a mão ao fazer isso. De fato, a palavra ressentimento vem de ressentir, isto é, voltar a sentir intensamente. Quando estamos ressentidos, sentimos com intensidade a dor do passado uma e outra vez isto, sem dúvida, não só tem um efeito lamentável em nosso bem-estar emocional, mas também se reflete em nosso bem estar físico.

Os falsos “benefícios” que obtemos ao nos prendermos à raiva.
Para muitos de nós, deixar a raiva e o ressentimento irem embora pressupõe um grande risco, porque parece que obtemos algo ao nos agarrarmos aos mesmos. Estes benefícios, ditos “ganhos secundários”, costumam ser inconscientes e têm muito poder até que tomemos consciência deles e descobrimos formas mais saudáveis de reagir.

Reflita se você utiliza a raiva ou o rancor de alguma das seguintes formas:

1. Você fica com raiva porque isso lhe dá a sensação de ter mais poder e domínio? Algumas pessoas acreditam que ficar com raiva e agarrarse ao rancor é sinal de poder, energia, entrega e amor próprio. Mas, na realidade, a raiva e o rancor costumam encobrir sentimentos de impotência, desilusão, insegurança, aflição ou medo, e são usados com freqüência em substituição aos sentimentos de verdadeiro poder pessoal.
Se na sua infância você foi maltratado e teve que negar e reprimir a raiva para sobreviver, parte de sua melhoria inclui o fato de dar-se permissão a si mesmo para exteriorizar estes sentimentos agora. A recuperação de sua raiva pode capacita-lo a defender-se a si mesmo e à sua criança interior ferida, que não pôde fazê-lo na época.
Entretanto, se recua da necessidade de enfadar-se e estabelece limites, então a raiva, necessária no começo para a sua capacitação e cura, finalmente acaba por eliminar sua capacidade de curá-la.

2. Você utiliza a raiva de modo impulsivo e como combustível para conseguir que as coisas aconteçam? Algumas pessoas acreditam que “se a gente não se irritasse, não trabalharia para conseguir mudanças sociais e políticas”. E de fato a raiva pode ser um ponto positivo para a mudança.
No entanto, não tem porquê ser o único, nem o principal, nem sequer se chegarmos a esse ponto, tem que ser um motivo para a mudança. Quando estamos em contato com nossa verdadeira natureza, animados pela empatia e um sentido de justiça, com freqüência nos sentimos motivados a atuar com paixão e convicção, sem raiva. Quando a raiva é o propulsor principal, costuma criar resistência à mesma mudança que se tenta conseguir.
Produz medo naquelas pessoas a quem tentamos convencer e gera oposição no lugar de resolução.

3. Você usa a raiva para controlar os demais? Você já percebeu que quando uma pessoa se enfurece, as pessoas próximas sentem-se culpadas e assustadas e por isso, às vezes, se deixam manipular? Se utilizarmos a raiva como um meio de manipular os demais, eles, por sua vez, sentirão raiva e ressentimento. É possível que consigamos dominar os outros com nossa cólera mas, como ocorre com todos os ganhos secundários, pagamos um alto preço por isso.
4. Você utiliza a raiva para evitar se comunicar? Quando temos medo de arriscar expressar nossos próprios sentimentos ou tememos as possíveis conseqüências de dizer a verdade, utilizamos a raiva como defesa para evitar a comunicação. É possível que se considere a raiva como algo mais seguro do que a intimidade e a comunicação autênticas.

5. Você utiliza a raiva para se sentir a salvo? Você acha que lhe serve de proteção? Quando se projeta a raiva para outras pessoas, estas costumam se manter afastadas. Como as pessoas não podem se aproximar muito, não temos motivos para nos sentir vulneráveis. Quando éramos pequenos ou jovens, o uso da raiva para nos proteger podia ser criativo e necessário, mas quando somos adultos, podemos aprender a estabelecer limites e reagir de outra forma com aqueles que poderiam querer nos dominar.

6. Você usa a raiva como uma forma de impor sua razão? Perdoar não significa que você deva reconhecer que a outra pessoa tem razão e que você está errado. É possível outra forma de enxergar o mundo. Será útil se perguntar: Desejo ter razão ou ser feliz? Ás vezes, não é possível conseguir ambas as coisas.

7. Você se prende à raiva para fazer com que os outros se sintam culpados? Se você se aborrece com alguém, talvez deseje castigá-lo. Uma maneira de conseguí-lo é reforçar o sentimento de culpa do outro. O principal problema é que, ao fazê-lo de modo simultâneo, ainda que inconsciente, reforçamos nosso próprio sentimento de culpa, o qual inevitavelmente nos torna tristes e diminui nossa auto-estima.

8. Você utiliza a raiva para evitar os sentimentos que esconde de si mesmo? Às vezes, é muito mais cômodo sentir raiva do que o temor e a tristeza que se ocultam sob a raiva. De fato, uma razão pela qual fica tão difícil perdoar é que para fazê-lo temos de colocar tudo às claras e aceitar a verdade do que realmente sentimos. Isso pode ser uma revelação dolorosa se tivemos aprendido a conviver com a negação e a repressão. Contudo, devemos tratar de lembrar amavelmente que do outro lado da dor se encontra o alivio e uma maior paz mental.

9. Você utiliza a raiva para segurar uma relação? Enquanto você se apóia na raiva, mantém a relação com a pessoa com a qual você se irritou.
Muitas vezes, as pessoas se divorciam com o fim de afastar-se de seu cônjuge. Mas enquanto guardem o rancor, permanecerão ligados a essa pessoa. Muitos jovens saem de casa para fugir da raiva e o ressentimento que sentem contra seus pais, mas se a raiva não está resolvida, sempre levarão consigo  o problema não resolvido.
10. A raiva lhe mantém no papel de vítima? Quando você passa grande parte de sua vida sentindo-se vítima, pode ser que tenha uma enorme resistência para perdoar, porque ao fazê-lo você renuncia a uma boa parte de sua identidade. Perdoar não significa negar que você tenha sido uma vítima; quer dizer que o fato de ter recebido uma agressão não domina a sua vida emocional atual.

11. Você continua sentindo rancor para não se responsabilizar pelo que acontece atualmente em sua vida ou do que sente? Este é talvez o ganho secundário que mais incita a manter o rancor, porque enquanto o fazemos, podemos culpar a outro por nossa infelicidade. Isto não quer dizer que os demais não contribuem para a nossa felicidade ou infelicidade, mas sim que em última instância, somos responsáveis pelo que sentimos.
Enquanto consideremos o problema exclusivamente como externo a nós, enquanto pensemos que não temos nada a ver com o que sentimos, continuaremos sendo impotentes.
A raiva crônica impede compreender que, independentemente de nossa relação atual com quem a provocou, somos responsáveis por nos prendermos a ela ou por tomarmos a decisão consciente de deixá-la passar e libertar-nos.
Então...
liberdade já!
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